sábado, 22 de novembro de 2008

O Trem

Esses dias minha mãe estava se queixando da minha falta de perspectiva na vida. Afinal, dois cursos universitários foram deixados pela metade ¹.

Estava tentando entender o porquê da minha falta de vontade em concluir as coisas, tudo bem que o primeiro curso, Publicidade e Propaganda, não tinha nada a ver comigo, eu tinha apenas 17 anos de idade e não tinha a menor idéia do que estava fazendo ali. Parei.

Depois vieram seis meses de pura vagabundagem, um ano de cursinho, falha no vestibular, ganhei uma bolsa e pá, comecei a cursar História. Ah, que maravilha que era sentar no meio de tantos anarquistas, comunistas, democratas e analfabetos para pensar na revolução que um dia viria, pelo menos era o que eles esperavam. No começo eu estava feliz, tudo era muito legal e interessante até que eu caí na real e percebi que não havia nascido para a vida erudita de professora de História (e menos ainda para o salário de um professor de História, não sejamos hipócritas), comecei devagar, faltando uma vez por semana, depois a semana toda e enfim, larguei. E agora passo meu tempo em um curso técnico de fotografia. Mas a falta de afinidade realmente não explica o fato de ter largado dois cursos universitários, minha mãe está certa, há algo de errado nisso. Hoje, voltando da aula de fotografia eu finalmente encontrei a resposta para a minha falta de motivação e irresponsabilidade educacional: O trem.



Convenhamos que nem todos nós somos filhos de Deus. Pois se fossemos, não teríamos que encarar o transporte público paulistano. Não sei quanto a vocês, mas eu odeio. Seja o trem, o metrô ou os ônibus (Aqui na Zona Leste ² chamados carinhosamente de peruas), mas percebi que tem gente que realmente gosta daquilo tudo, aliás, aproveito esse espaço para agradecer a Nokia pelos novos modelos de celular que tocam como se fossem rádios, as pessoas se esqueceram dos fones de ouvido. Valeu, Nokia. Agora posso escutar sempre o Bonde do Tigrão enquanto estou tentando ler, valeu por arruinar a minha vida.

Voltando à felicidade dos outros no trem, vou me limitar ao Expresso Leste da CPTM que liga a estação da Luz a Guaianazes. É fato que, se você não tem estômago, não vai andar de trem. Sim, é cheio, apertado e fede, mas o metrô de Londres também é assim e aposto que em todos os lugares é. Mas o que é mais interessante no transporte paulistano são as pessoas que freqüentam, podem dizer o que quiserem, mas as pessoas se divertem ali. É quase como a cocaína. Vão lá nas estações terminais e digam que estou mentindo. Olhem para aqueles olhinhos saltados, a sudorese, o coração disparado quando aquele imenso pedaço de metal se aproxima, vagarosamente, da plataforma. Ah, eu posso sentir a excitação.




Quando o trem abre as portas é o clímax, as pessoas que estão dentro tentam sair enquanto as que estão fora tentam entrar. É sempre a mesma coisa, quem ta dentro sempre sai xingando e quase sempre dá briga, mas amiguinhos, vocês se esquecem de que quando estão do lado de fora TAMBÉM empurram, socam, chutam qualquer velhinha só pra poder sentar, ao lado da janela de preferência. Observei tudo isso hoje, enquanto esperava uma chance de entrar no trem, afinal não posso viajar como uma sardinha em lata considerando o problema que tenho nas costas (começa com Canon e termina com Cara), então eu espero a chance de poder entrar, me alojar em algum canto seguro e, novamente não sejamos hipócritas, se for possível me sentar. Mas só se for possível, afinal eu não cruzei o deserto a pé pra estar tão podre. Já os felizardos, aqueles que conseguem sentir a vibração, eles dão a vida pelo assento. É uma gritaria, e todos riem, inclusive as velhinhas que também batem em quem for necessário para conseguir seu lugar. Pensando em tudo isso, não é surpreendente que eu tenha largado a faculdade (por duas vezes).


¹ Os cursos largados foram: Publicidade e Propaganda no primeiro semestre e História no quarto semestre.

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